O poder do discurso
Não resisto a deixar aqui a transcrição integral do Editorial do "Jornal de Negócios" de hoje, da autoria de Sérgio Figueiredo.
"O Presidente da República está cansado do dr. Sampaio. Perdeu a paciência para o seguir do 25 de Abril para o 5 de Outubro e do 5 de Outubro para o 25 de Abril depois. É incapaz de ouvir aquele discurso de alerta. Sempre de alerta. Sempre o mesmo discurso. O país já conheceu três Governos. Já foi Guterres e já foi Barroso.
Dezenas de ministros tomaram posse. Centenas de leis foram produzidas. E o que diz Sampaio a este primeiro-ministro? Que é preciso fazer as reformas estruturais...
Que conclusão mais original!? Só faltou apelar à serenidade. Se é ele quem diz que a crise é aguda, se existe o perigo de regresso ao que designa de «um ciclo de declínio nacional», então deve agir em função dessa emergência colectiva.
Sampaio não pode, a coberto da separação de poderes, permanecer nas críticas evasivas ou descansar a sua consciência através de lamentos justificativos.
Num destes discursos já passados, fomos recordar o que então inquietava o Presidente, num dia em que se celebrava a Revolução. Que o país não era rigoroso na definição das prioridades políticas, na execução das reformas, na gestão orçamental. Que faltava ética no serviço público. Que o Estado não conseguia realizar a sua própria reforma: era lento, pesado, centralista e fraco na defesa do interesse colectivo.
Aliás, o Presidente sentia então que, nos últimos tempos, os grupos de interesse estavam a sobrepor-se ainda mais aos interesses do cidadão. E lá vinha o rol das ditas reformas estruturais. No sistema fiscal. No sistema judicial. No sistema de segurança. Na saúde. E até na educação, onde a política orçamental estava a derramar milhões e milhões para justificar a paixão de Guterres.
Há diferenças? Sim e não. Não, porque, quatro anos e meio depois, são as mesmas reformas que Sampaio reclama. O serviço público continua manietado pelos interesses «burocráticos, corporativos e clientelares». Lá está a Justiça e a evasão fiscal. O apelo ao «Estado forte» e à sua reforma.
Quase concluídos dois mandatos, Sampaio ainda acredita que os seus discursos vão mudar o país. Dá um raspanete ao primeiro-ministro do momento, recebe uma valente ovação... e pronto!
Mas sim, há diferenças porque, com o seu alto patrocínio, este Governo está mesmo a provocar fracturas sérias. Para o bem e para o mal, Santana decide em catadupa sobre matérias para as quais o Presidente anda há muito a pedir reformas.
Sampaio está tão viciado no mesmo discurso que, qualquer dia, as reformas fazem-se e em Belém não dão por isso.
Está ou não em curso a limpeza que se exigia aos benefícios fiscais? Há mercados que se liberalizam com fortes impactos sociais (rendas) ou empresariais (energia). O fim das SCUT corresponde ou não à crucial definição de fronteiras entre o utente e o contribuinte? O avanço dos regimes privados de reforma significa um corte da relação exclusiva entre o Estado e a Segurança Social.
Entre interrogações e certezas, o cidadão a quem Sampaio frequentemente se dirige gostava de saber, em concreto, se o Presidente apoia ou assina de cruz a enxurrada de medidas e de ideias que este Governo, todos os dias, lança sobre nós."
Como vê Sr. Presidente, até os editorialistas dos jornais que têm por público-alvo a(s) classe(s) representada(s) no governo que V. Exª. viabilizou contra a vontade dos mais desfavorecidos deste país e das forças democráticas que votaram em si, começam a ficar fartos de si. Tenha cuidadinho, Dr. Jorge Sampaio... olhe que eles não perdoam... são uns ingratos do caraças que até são capazes de morder a mão que lhes deu de comer.
Veja lá se - de uma vez por todas - coloca na sua magistratura a alma que (ainda) se espera de si. Caso contrário, se (já) não for capaz de tal desiderato, então demita-se !
(posted by Fora-de-Lei in http://artigo131.blogspot.com at 06/10/2004)
posted by Fora-de-Lei @ 10:56
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